16.1.06

Exemplo

Um exemplo para ilustrar o último post: Há uns tempos, falou-se da possibilidade de aumentar a escolaridade obrigatória para o 12º ano. Não me lembro de ter ouvido uma única voz discordante, entre políticos e comentadores. Mas também não me lembro de nenhuma ideia mais absurda que essa... Quem conhece o ensino português sabe que a escolaridade obrigatória não funciona sem haver uma divisão entre alunos, que permita que alguns sigam ensinos aplicados (carpintaria, electricidade, etc.). Com o sistema actual, escolaridade obrigatória até ao 9º já é uma aberração... Nem para isso dá, o nosso ensino... Aumentar a escolaridade apenas vai diminuir ainda mais o nível de exigência do 10º-12º.

E lá está, uma ideia que parece bondosa e soa bem, obrigar os nossos meninos a estudar mais tempo. Mas também é uma ideia que mostra um desconhecimento profundo da miséria que é o ensino português. As matérias são pouco exigentes, pouco profundas, muito dispersas. Os alunos podem passar mesmo que não saibam. Obrigá-los a "pastar" na escola mais 3 anos é o quê? Criação de hábitos de preguiça? Por outro lado, os poucos alunos ainda interessados em aprender ficarão cada vez mais desmotivados com mais um abaixamento da qualidade e exigência do ensino. Acho que nem preciso de estar a argumentar mais, de tão óbvio que é.

Sei que imensa gente concorda comigo. Porém, não se fizeram ouvir. Quem apareceu foi quem não percebe nada sobre o assunto. As mesmas pessoas que nos vão acusar a nós (e fazer pagar) quando tudo ruir.

Pronto, já estou de mau humor...

5 comentários:

Anónimo disse...

Em certa medida estou de acordo contigo, mas pensa que nos tempos actuais talvez já não se consiga justificar um ensino obrigatório que termine no 9º ano. Apercebi-me disso quando fiz a inspecção militar, há uns anos. Foi-nos dito muito claramente que quem não tinha o 11º ano terminado seria convocado para incorporar-se ao serviço militar, e que os que tinhamos no mínimo o 11º passaríamos directamente à reserva militar. E eu lembro-me de ter pensado "11º?? Não era o 9º??..."
Parece-me que para Portugal poder competir com a Europa, tem de subir realmente os níveis de exigência e de qualidade do ensino, ainda que isso não implique necessariamente mais anos de estudo... Mas a verdade é que soa um bocadinho absurdo falarmos em apenas 9 anos de escolaridade obrigatória quando já nem com uma licenciatura se garante emprego! O 9º ano é como a antiga 4ª classe -- inútil.
Eu acho que a maioria dos estudantes nem se vai aperceber desta alteração da lei, já que estou a pensar em gente que acabaria por fazer os 12 anos de estudo de qualquer forma, e depois seguiria, ou não, para a faculdade. Mas é verdade que existem discrepâncias entre os alunos que podem conduzir ao panorama que tu descreveste. Suponho que se teria de tomar medidas inteligentes e pedagógicas de forma a que o nível do ensino não só não baixe, como inclusivamente suba... Mas isso são outras águas...

Enoch

/me disse...

Percebo o que dizes e já vi que concordamos. No abstracto, a ideia é bondosa, mas é impracticável. A solução: fazer uma divisão dos alunos mais cedo, não sei bem a que idade, talvez no fim do 6º ano. Aí fazia-se um exame nacional e as escolas aconselhariam cada aluno a seguir um ensino mais generalista ou mais virado para a obtenção rápida de um emprego. Têm é de se criar escolas que ensinem empregos mais "básicos" e apoiar as que existem.

Esta separação permitiria subir o nível do ensino generalista (tendo em vista a universidade) para níveis aceitáveis e evitaria a desmotivação e passagens administrativas dos demais alunos.

O problema é que vamos de palavras bonitas em palavras bonitas, e como somos todos iguais temos todos direito ao mesmo ensino, mesmo que tenhamos vocações diferentes. Deve-se apoiar os alunos com mais dificuldades, é claro, mas isso não significa baixar o nível de todo o ensino, até porque (paradoxalmente, admito) isso apenas lhes vai complicar mais a vida, e acentuar as desigualdades. O ensino igual para todos não dilui as desigualdades, ao contrário do que alguns pensam... Quem pode, contrata explicadores... Os outros não têm acesso a ensino de qualidade em lado nenhum, nem sequer na escola...

Adicione-se a isto à escolaridade obrigatória começar aos 4 anos (aí sim...), devolva-se autoridade aos professores - não é preciso castigos corporais, mas se for necessário aplicar outros castigos, que sejam bem aplicados - aumente-se o grau de exigência, implementem-se exames nacionais ao fim de cada ano do ensino e também para quem quiser ser professor. Esqueçam mariquices como obrigar os professores a estar na escola só por estar, e obriguem-nos é a ensinar bem. Usem como medida de sucesso escolar não quantos passam, mas o quanto aprendem. Depois tomem-se as medidas para ajudar quem precisar de tal.

Miguel disse...

Como gostaria de te animar. No entanto, sabes o que penso...
Tens razão!

Anónimo disse...

Em relação à qualidade do ensino não sei se concordo contigo. O objectivo do secundário não é saber tudo sobre a Química ou tudo sobre a Física, é ter um conhecimento geral para depois aprofundar na Universidade. Para além disto, um filho de um conhecido meu foi estudar para o estrangeiro e ao chegar lá o pai perguntou-lhe se a preparação dos estudantes de lá era melhor do que a dele, com que ele simplesmente respondeu "Não". Aqueles que querem ter uma preparação boa, conseguem-na. A mentalidade que tem de mudar é a de casa; os pais têm de ver a escola menos como lugar em que os miúdos "passam o tempo" e mais como o lugar que os prepara para o futuro. Porém, também não estou a dizer que o nosso sistema é perfeito, longe disso, mas também não está à beira do colapso como o dizes.
Concordo que tem de haver uma maior divisão dos alunos. Há muita falta de técnicos, já tentaram fazer com que alguém viesse arranjar a máquina de secar roupa? Muitas vezes estes até ganham mais do que os licenciados, e de uma maneira ou de outra , se quiserem mais tarde prosseguir estudos na universidade vão estar muito melhor preparados. Uma companhia norueguesa com a qual tive contacto até me disse que pagavam parte da formação, do curso técnico ao universitário, desde que, após os estudos, permanecesse no mínimo 8 anos na companhia.
Por outro lado, também não podemos simplesmente importar um sistema educacional de outro país, pois a mentalidade local também varia.Enfim, talvez a forma mais fácil será mesmo tornar-nos todos em blood-thristy capitalists! GREED IS GOOD! *Muhahahaha*

/me disse...

Certo, o objectivo do curso é ter-se um conhecimento geral... Ou seja, saber-se um pouco de cada coisa... Um pouco de física, um pouco de química, um pouco de literatura, de filosofia... Deve-se ensinar os alunos a pensar, não a decorar. Concordo absolutamente. Mas tudo isso começa pelo ensino de conteúdos, e não por brincadeiras ou joguinhos. E aí, tem de se ensinar com qualidade e profundidade.

Quanto ao nosso sistema, acho que já está há muito para além do colapso. Está moribundo, mesmo... A prova disso são os resultados que os alunos portugueses conseguem em provas internacionais. E a forma como eles chegam às universidades... E essencialmente, a atitude deles perante a vida...