Há alguns anos vi uns retalhes de um filme francês numa sessão de zapping. Neste, numa cena pós-ménage a trois - não, o filme não era pornográfico, era sim francês! - entre uma mulher e dois homens, um judeu e um muçulmano, esta diz, suspirando:
"Sinto-me como uma cidade santa".
Se calhar não acharão assim tanta piada, mas a mim doeu-me a barriga de tanto rir. Antes de mais, só mesmo os franceses para dar um nome charmoso a uma cena a três. Haverá poucos povos que respirem mais sensualidade, de uma forma tão natural. Mas o que me encantou foi o humor inteligente, a evocação de uma situação ridícula num momento constrangedor, a capacidade de rir de tudo e de si mesmos em simultâneo. É revelador.
Fez-me pensar nas consequências que tem para Portugal e para o mundo o abandono da língua francesa - e, inevitavelmente, da respectiva cultura - pela língua inglesa. Sou demasiado novo, demasiado inculto, para poder ter uma opinião fundada. Mas, do que conheço dos franceses, acho que têm um savoir vivre e uma sagesse d'esprit que nos interessaria conhecer. E, cada vez mais, é um mundo desconhecido. Aliás, dá-me a impressão que a França é culturalmente uma ilha, para o bem e para o mal. E cada vez menos os nossos barcos atracam lá. Choca-me ver como as referências culturais de origem francesa foram, em tantas pessoas, completamente esquecidas. Digo eu que não tenho (quase?) nenhumas.
"Sinto-me como uma cidade santa".
Se calhar não acharão assim tanta piada, mas a mim doeu-me a barriga de tanto rir. Antes de mais, só mesmo os franceses para dar um nome charmoso a uma cena a três. Haverá poucos povos que respirem mais sensualidade, de uma forma tão natural. Mas o que me encantou foi o humor inteligente, a evocação de uma situação ridícula num momento constrangedor, a capacidade de rir de tudo e de si mesmos em simultâneo. É revelador.
Fez-me pensar nas consequências que tem para Portugal e para o mundo o abandono da língua francesa - e, inevitavelmente, da respectiva cultura - pela língua inglesa. Sou demasiado novo, demasiado inculto, para poder ter uma opinião fundada. Mas, do que conheço dos franceses, acho que têm um savoir vivre e uma sagesse d'esprit que nos interessaria conhecer. E, cada vez mais, é um mundo desconhecido. Aliás, dá-me a impressão que a França é culturalmente uma ilha, para o bem e para o mal. E cada vez menos os nossos barcos atracam lá. Choca-me ver como as referências culturais de origem francesa foram, em tantas pessoas, completamente esquecidas. Digo eu que não tenho (quase?) nenhumas.
Até tenho vergonha de publicar este texto, acho-o de um atrevimento incrível.
22 comentários:
Embora não aprecie os filmes franceses, fez-me rir isso da "cidade santa". Eu vejo o canal de música francês, também é cultura, e canto (mal) músicas francesas lo. Já conta para alguma coisa. Ah, e como muitos portugueses, tenho família em França e por influência disso como Ratatouille e Galette des Rois (yumie yumie lol).
/me, isso são os jogos de influências a nível mundial e não uma coisa tuga. Os países anglófonos e mesmo os de língua espanhola têm conseguido aumentar o seu raio de acção enquanto se sente um menor esforço da parte francesa em se impor e aí funciona a lei do mercado. Quem não aparece, esquece!
DE Gaulle dizia: "A França não sabe fazer reformas, só sabe fazer revoluções". E, no geral, temos muito a agradecer às revoluções franceses. As que se fazem nestes dias são, também elas, feitas nas ruas de Paris, mas sem as motivações das de outrora.
Os tempos mudam! Se a França foi um império, sobretudo cultural, há muito que começou a deixar de o ser. Países como a Espanha estão a tomar o seu lugar. A História é isto. Movimento, mudança...
Ah... Quanto à última frase do teu post. Bom, com atrevimento ou sem, publicaste! Parabéns por isso. :)
LusoBoy , também tenho família em França, mas quase nunca os vejo. Adoro o nome Ratatouille!!! O francês é uma língua tão gay. :p
Ratatouille. Bijoux! Chérie! Uhlala! Bof! Zut! Ah bon!
Isolamentos, eu gosto muito do inglês. Língua e cultura. E não sou saudosista, o que lá vai, lá vai. Mas gostaria de ter o melhor dos dois mundos. O que me faz mais confusão é que os nossos pais (se assim posso falar) cresceram num país afrancesado e nós num país inglesado. E, sendo que temos as nossas referências culturais, é um desperdício não aproveitar as das gerações anteriores. Pronto, mas de novo, sou demasiado ignorante para esta discussão.
Queer Gourmet, coitadinhos dos franceses, eles bem se esforçam, temos de lhes reconhecer esse mérito. Mas estão isolados.
NaSacris , é impressão minha, ou as "revoluções", com ou sem aspas, que estão a decorrer neste momento na França são vistas por nós com estranheza? Deixámos de perceber a França. E é estranho, porque penso que temos lá bastantes raizes culturais.
Pois, o francês é a minha segunda língua, vivi e estudei quatro anos em Paris, sei a História de França quase como a de Portugal, conheço a literatura deles quase como a nossa, estudei Matemática "à la sauce Bourbaki", conheço a música popular francesa dos anos 50/70 como nenhuma outra ( tirando a Clássica ), aprecio a comida deles, la douceur de vivre de la douce France.
Nunca amei um/a francês/esa; não é que eu seja tímido ( não sou ), mas para o meu gosto são demasiado desenvoltos ( claro: não foi por causa disto; simplesmente, não calhou ). Tenho muitos amigos franceses, mais eles que elas, quase todos músicos ( partilhei casa - castamente! - com um músico do Porto num complexo de apartamentos, o Foyer Maurice Ravel; havia músicos debaixo dos tapetes ).
Gosto muito deles e não me desagrada que prefiram as revoluções às reformas: é um reflexo do seu racionalismo, da sua convicção que a razão pode determinar o curso que as coisas DEVEM seguir, independentemente de como de facto seguem. Às vezes exageram: todas as Primaveras se me apertava o coração ao ver os pobres castanheiros do Jardim do Luxemburgo aparados, aprumados e enfilados como um regimento de Frederico II ( os franceses não são bons em paradas militares estáticas ). Até os castanheiros, pobrezinhos ... Pensava nos catanheiros do meu Trás-os-Montes, crescendo livremente, deitando as pernadas para onde lhes apetecia - e gostava muito de ser português.
ZR.
( Onde está o atrevimento do post? )
Isolamentos, não me resta senão concordar contigo.
ZR, o atrevimento está no facto de eu não conhecer de facto as influências das outras culturas na portuguesa. De não ter assistido ao às mudanças na sociedade portuguesa antes do meu nascimento, apenas poder adivinhar, pelo que conheço. Falo muito por instinto. Mas olha, gosto dos franceses. Principalmente da sua desenvoltura. Mas também acho que lhes sobram defeitos. :) Generalizando, claro está!
Mon chére /me, (e não dear/me)! eheheh
A verdade é mesmo como tu dizes. Os nossos pais viveram num portugal afrancesado e nós num inglesado. Enquanto há algus anos, grande parte dos alunos no ensino secundário tinham o francês como segunda lígua, hoje o Inglês claramente tomou o seu lugar. Tantos como eu só tiveram a lingua francesa durante três anos no secundário. E isso depois notou-se. Hoje em dia, profissionalmente, vejo que os meus colegas mais velhos preferem sempre literatura em francês, enquanto os mais novos em inglês. Motivos para tal evolução? Alguns já aqui foram expostos, e, de uma forma geral concordo com eles, com todos eles.
Mas admito que se enquanto pequeno tudo o que era inglês(americano), me fascinava e o francês me era indiferente, hoje me dia não é assim. França estimula-me!!! Adoro ir a Paris, descer os Campos Elísios, com calor, com frio, ver as lojas, a torre effiel, o arco, as pessoas, as baguetes, os franceses (oh la la!!!), a língua (não sejam porcos, a língua falada, infelizmente nunca provei de outras.... :( ), a diversidade de pessoas, a moda, a cultura, o cinema, enfim... ADORO IR A PARIS.... ;)
"Merci" É tão bom de dizer!
Ou seja, só descobri a cultura francesa um pouco depois da adolescência.
É tão fixe andar no metro em frança e ver quase toda a gente a ler um livro (algo impensável em portugal). É tão fixe andar no frio com um casacão e com um cachecol. É tão fixe ver que eles andam tanto a pé e deixam os carros em casa.
Tenho saudades de frança...
Mas mesmo com alguns, pequenos defeitos/falhas, Portugal é Portugal...
aequilibrium:
O Eça dizia de Portugal: "É uma choldra - mas é a nossa choldra".
Ao contrário do que vulgarmente se pensa, era profundamente patriota - só que não contassem com ele para nacionalismos estreitos e estúpidos.
ZR.
ZR.
Continuo a não ver razões para atrevimento, /me:
Eu não tenho que estudar história da Grécia para ter o palpite que o café borrento que bebem deve vir dos turcos; e, se assim não for, alguém me corrigirá. A perspectiva da correcção não me impede de o dizer - sem atrevimento.
Um abraço,
ZR.
lol :)
Concordo!!!
Sou "obrigado" a concordar com o Isolamentos não fomos nós que perdemos o interesse pela cultura francesa, mas sim ela que se foi apagando. Perdeu em muito o seu valor (não relativamente ao passado que esse ninguém lho tira). Eu não gosto de falar francês. Irrita-me o enrolar da língua que me provoca, mas aponto as culpas para a minha professora de francês do ciclo. Em compensação adoro cinema francês. Adorei o Amelie (mesmo que muita gente que é um filme já americanizado), Gostei do The Dreamers (que não é bem francês, mas passa por isso :P) e um que pouca gente conhece chamado Irreversível (com a Monica Belluci). De facto esses são alguns dos filmes que mais gostei durante a minha vida, mas tirando os filmes não tenho muitas referência contemporâneas da cultura francesa.
Os próprios franceses estão-se a perder. Depois de momentos brilhantes o país está a entrar em ruptura. Com a quebra dos subsídios para a agricultura (os até então maiores da Europa), a crise nas reformas (muitas das quais enviadas para outros países, porque França sempre foi um pais com muitos imigrantes, basta ver a quantidade de tugas que lá esteve ou está) já para não falar nos confrontos entre Estudantes e Polícia (ah e com os arruaceiros à mistura).
De um ponto de vista egoísta só espero que saibam aproveitar a crise para produzir algo de novo (basta ver que algumas das melhores obras culturais que temos surgiram em tempos de crise). Até lá vou ser um fã da "cultura" inglesa. Da suposta facilidade da língua (porque diz quem estuda que o inglês não é nada fácil, cheio de excepções e casos específicos para certas palavras), dos filmes em inglês (gosto de filmes ingleses, americanos nem por isso) e (alguma) música em inglês.
Abraço
O usuário Anónimo respeita o título do post:
De facto os Franceses ainda nos devem algumas, nomeadamente o nosso próprio brio de ser português. Não me refiro obviamente apenas à "La revolución /militaire/ Française", mas também ao trato dos nosos serventes, pedreiros, apanhadores de morangos e tomates, em sumo, a todos estes "princes de sang" emblemáticos de quem somos! Por isso, eu arriscaria a calúnia como modo natural e tão próprio da nossa natureza de ser português, para me dirijir a todos esses franceses, mas, era capaz de perder, por isso escolho este tão nosso modo empreendedor absolutista de ficar calado e assistir impávida e serenamente a todos estes acontecimentos, negando que tenham alguma coisa a ver comigo, com o tempo em que vivemos, ou mesmo com a geração dos poucos portugueses que enfrentam a alegria de estar desempregado. Por isso, resolvo, benificiar, neste aspecto, as revoluções espanholas face às francesas. Não será mijar fora do penico, ou levantar demasiado a bolinha isso de se manifestar contra essas medidas? queixam-se do fundo de desemprego? serei ignorante? Não percebo. Claramente, prefiro apoiar antes a causa dos nuestros hermanos que sofrem a repressão no seu país pelas medidas que o seu governo pretende implementar, medidas estas que enclausuram, inibem, prendem, aprisionam, atrapam os jovens, nos quais revejo as nossas futuras crianças.
Eu já me decidi: Eu apoio a luta contra a lei Anti-Botellón!! e tu? já te decidiste?
Ass: o ébrio usuário Anónimo
Bonsoir «Me»!
Não tenhas qualquer problema em publicar os teus textos. Não sei qual a tua idade, mas revelas muita maturidade ao escrever. Tens muito cuidado com a tua escrita e revelas muito bom senso nos teus textos. O mesmo digo das pessoas que comentam no teu blog.
Não comento o que tu dizes porque concordo plenamente contigo. Continua com o teu excelente trabalho. MERCI !
Um abraço(português mas um pouco longíquo )
Eu sempre adorei a língua francesa. A sonoridade que se fala em francês é algo de indescritível. A música e o cinema em francês são únicos, especiais. Não é ao acaso que Paris é a cidade favorita de tantas pessoas tão diferentes entre si noutras coisas. Faz parte dos meus projectos a curto prazo voltar a investir no francês.
Mon chér ami /me
Eu faço parte daquela última geraçäo de portugueses que ainda tiveram o francês como segunda língua a partir do 6º ano. Sempre achei que o francês tem muito mais "charme" que o inglês, além de que sempre tive muito mais facilidade para a pronúncia francesa que para a inglesa... os "rrr" däo-se bem comigo :)
Mas como já disseram por aqui, a verdade é que como tudo nos chega em Inglês, o francês deixou de me ser útil desde que deixei de o estudar... com a inevitável consequência de o esquecer...
A cultura francesa já näo tem o fulgor que durante séculos iluminou a Europa.
E a piada do filme é deliciosa! :)
Malgré tout, Paris continua a ser a única cidade pela qual eu trocaria o meu Porto se tivesse de sair daqui definitivamente!
Estou plenamente de acordo com o ébrio usuário anónimo na luta contra a lei Anti-Botellón, gosto de causas justas e regadas a sangria. Para a minha geração, que não estava em parte alguma no vinte e cinco do quatro isto é uma castração da liberdade pessoal, pois a mim ninguém me diz onde beber! Só não gosto muito dos sacos que ficam pelo chão e das garrafas mas este é claramente um bom ponto a favor do baixo desemprego em áreas como a limpeza urbana...
No Verão temos as esplanadas que estão sempre cheias e vai daí uma pessoa senta-se onde de copo na mão? Ora, claro está, num banco na Praça ou mesmo no chão. Claro que não estou a ver AR sentadinha no chão, mas seja a bem da Revolução...
Será de mim ou em Portugal não bebemos na rua? Deve ser do clima. No Brasil também me fartava de beber na rua. Precisamos de uma Revolução "a la portugaise", ou seja, é preciso levar as pessoas a beber na rua. Porque é que andamos sempre no sentido contrário aos ponteiros do relógio??
Os nossos copos jamais serão vencidos! O povo unido de copo na mão tem mais força! Força popular: unidos depois do jantar!
Assinando este manifesto pela luta da qualidade de vida manifestada pelo prazer do copo de rua,
AR
PS - Porque o copo quando é de plástico não parte!
/me...
como é mágico alguém sussurrar umas palavrinhas românticas ao ouvido...
bigada pela visita... vai aparecendo
jinhus
Bem, eu não consigo responder a tantos comentários. :p
Mas também estou contra essa lei! Abaixo a lei!
Desconhecido, obrigado. :) Tenho 25 anos. E, efectivamente, as pessoas que comentam o blog é que lhe dão sal. ;) Eu até já escrevo a contar com isso. :D
Adorei o texto...se queres saber
Deixo um sorriso em tons de AZUL-NOITE-MAR!
BLUESHELL«~«~«~«~«
~«~«~«~«~«~«~«~«~«~«
~»~»~»~»~»~»~»~«~«~«
Que pagode esse "cidade santa"...Uma barrigada de riso, de facto. Não saberás, por acaso, o nome do filme???
Mais ainda: excelente post, excelente blog. Parabéns :)
Enviar um comentário