Alguns dos meus amigos já conhecerão a minha teoria do egoísmo mínimo (que hoje passarei a denominar por Princípio do egoísmo funcional - pode até nem valer muito como pensamento filosófico, mas tem um bom nome).
Tenho uma tia minha que gosta de me dar dinheiro, bem como aos outros sobrinhos. De cada vez que a vejo, é uma nota de 10 euros ou de 20, às vezes "apenas" umas moeditas, em ocasiões especiais quantias maiores. Claro que é desconfortável aceitar por sistema dinheiro de alguém de quem se gosta, porque o importante é que se goste, não o vil metal. Durante muitos anos debati-me com o problema: "devo ou não aceitar esse dinheiro"? Por um lado, não devo, é claro. Poderei estar a alimentar inseguranças da minha tia, e quem sabe se ela não precisará do dinheiro mais tarde (claro que me terá a mim para recorrer, mas nunca se sabe como corre a vida, ou se cá estarei)? Por outro lado, se a minha tia gosta de dar, eu gosto de receber, e ambos sabemos que gostamos um do outro, porque lhe hei-de negar a ela o gosto de eu ficar contente por receber algo que me dá? A isto chamava a minha teoria do egoísmo mínimo.
Vem isto a propósito de ele dizer que sou mau. Acho que finalmente percebi porque às vezes as pessoas pensam isso. Eu sou uma pessoa que se rege pela ética. É a esse altar, e não ao das emoções, que sacrifico (às vezes sacrifícios enormes). Posso perceber que isso me pinte de mau, pois penso quando o outro sente. Para além disso, o facto de eu procurar fazer o melhor para o outro, neste caso para ele, pode ter esta leitura: sou egoísta, porque coloco a minha "necessidade" de ser ético à frente do bem dos outros.Talvez haja alguma razão aqui: quando tento fazer o melhor para os outros, e actuar de uma forma ética, estou a ser algo egoísta. Mas, na realidade, estou também a ser quem sou. Não é melhor nem pior que responder à realidade ao sabor dos sentimentos. É a minha forma de ser.
Finalmente, percebi a minha inadequação perante tantos episódios da minha vida. Percebi porque algumas pessoas - que passado algum tempo se voltaram a aproximar de mim, ou pelo menos sempre tem sido assim - me achavam às vezes frio e mesmo mau. Percebo porque ele diz que tenho de mudar. Coloco a ética à frente das pessoas. Mas isto é muito paradoxal, porque a minha ética vai no sentido de fazer o melhor para as outras pessoas! Logo, poderei ser incapaz de cumprir os ditames da minha consciência, mas não sou egoísta, poderei quanto muito ser inábil. E acho que já percebi porquê. Falta-me aplicar o princípio do egoísmo funcional às relações. É contra aquilo em que tenho acreditado, mas, se à luz deste pensamento, achar que é o melhor para os outros, fá-lo-ei. Mesmo que isso me magoe. Para mim, o ênfase da ética não é sentir que fiz o meu melhor, mas fazer mesmo o meu melhor para os outros. Custa-me a acreditar que na prática ser-se mau pode na realidade ser bom para os outros, enquanto que ser bom (fazer o que se acha ser melhor para os outros) pode ser mau para esses outros. A vantagem de quem se guia pela ética é pode sempre tentar adequar os seus comportamentos e moldá-los com a experiência. O mesmo não se aplica tanto a quem segue meramente as suas emoções.
Viver não é fácil. E às vezes é bem doloroso.
13.12.05
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