4.2.06

Crista da onda

Principalmente para os católicos, como eu, deixo a pergunta: porque é que a homossexualidade é pecado?

Eu acho que não é.

Esta é uma questão fundamental para mim, por motivos óbvios.

Fui educado numa atitude de respeito temeroso e acrítico para com a Igreja e o Santo Padre. Por uma questão de prudência, mantive essa mesma atitude durante anos a fio. Não me arrependo, porque a isso a minha consciência o obrigava. Porém, a História ensina-nos que a Igreja, Santa como a acreditamos, é composta por homens que erram. Não ponho em causa Deus, a minha Fé, o Credo ou qualquer dogma. Assumo-me Cristão e Católico. Ao mesmo tempo, tenho sérias reservas quanto aos ensinamentos da Igreja relativos à sexualidade, em particular à vivência da orientação sexual.

Amai-vos uns aos outros, disse Cristo. Se alguém deseja fazer alguém, neste caso do mesmo sexo, feliz e partilhar a sua vida com essa pessoa, valorizando mais as necessidades dessa pessoa que as suas, isso é amor (agape, para quem leu a última Encíclica). Até aqui ninguém coloca problemas. Se, porém, para além de esse amor, houver também amor erótico, exigem que isso seja colocado de lado. Ou seja, que se ame só com a alma, não com o corpo. Ou que não se ame de forma nenhuma.

Dizem uns que o amor homossexual é só desejo carnal. Outros que é uma amizade pervertida. Estranho que cristãos se coloquem assim tão facilmente em posição de julgar o que desconhecem. Há casos de casais homossexuais em que um fica em coma e o outro passa o resto da vida a tomar conta deste. Dificilmente se poderá chamar a isso desejo carnal. Quanto a ser uma amizade pervertida, o que quer isto dizer? Que o amor agape deixa de o ser se a este se juntar amor erótico, no caso de se tratar de pessoas do mesmo sexo? Nada disto me faz sentido.

Citam-se as escrituras, para condenar a homossexualidade. A contextualização que se faz noutros temas (escravatura, direitos das mulheres, etc), passa a ser relativismo, se aplicada às passagens sobre a homossexualidade. Até o Levítico é citado com convicção. Vale tudo, o que importa é justificar que a homossexualidade seja vista como nojenta. A pressa de condenar atropela a seriedade que se dá à reflexão sobre o tema. Diz-se que sempre foi assim, conta-se a história de Sodoma e Gomorra, ignorando que esta não era interpretada como um condenar da homossexualidade pelos primeiros cristãos, e também já não o é agora.

Falta muita caridade e até seriedade, nesta discussão. Do muito que tenho lido, reflectido e discutido sobre o assunto, acabei por concordar com os que acham que não é claro o que a Bíblia diz sobre a homossexualidade, que será mesmo omissa sobre o assunto.

Dito isto, para um Católico que concorde e viva os preceitos da Santa Sé, o pecado que um homossexual comete ao comprometer-se a uma vida em fidelidade, amor e partilha com outra pessoa do mesmo sexo, é quando muito equivalente ao de um casal heterossexual que use a pílula. Que estranho então que tudo isto cause tanto nojo e tanta repulsa. Ao ponto de dizerem que permitir-se o casamento civil a homossexuais vai conspurcar o conceito de casamento (supõe-se o religioso?) e destruir a sociedade.

Todo o assunto merece ser relectido de novo, sem preconceitos, por Teólogos e por todos nós. Entretanto, é preciso caridade.

5 comentários:

/me disse...

Oh, Zé, reza mas é por mim. ;)
Obrigado a ti.

/me disse...

Obrigado e prometido! :)

Assumida Mente disse...

Me, parece que me andaste a ler os pensamentos! ;-)
Tão bom seria se os teólogos aceitassem o teu desafio e, expurgados de preconceitos nada católicos, fizessem uma reanálise rigorosa e coerente com toda a técnica por si usada da doutrina da Igreja sobre esta matéria!
É certo que nem eu, nem tu, nem sequer os mais conhecedores teólogos dos nossos dias, podem afirmar com toda a certeza qual será a verdadeira vontade de Deus. No entanto, estou contigo na profunda convicção de que aos olhos de Deus não poderá ser pecado aquilo que é a pura expressão da mensagem mais basilar de Cristo: o Amor!
Obrigada por este post, /me!

Pedro Leal disse...

/me

Vim aqui atrás das cinco manias (essas do Benfica e do queijo são comuns...) e acabei por ler este post.
Já conheces a minha opinião, mas gostava de chamar a atenção para um ponto.
A relativização (ou contextualização abusiva, no meu ponto de vista) da Bíblia tem precisamente o problema da caixa de Pandora. Abres uma excepção e fica tudo em causa. Tu escolhes a questão da homossexualidade e a da condição feminina. Eu posso escolher o Sermão do Monte e os mandamentos do amor. Outro ainda, pode escolher a divindade de Cristo ou a veracidade dos milagres.
Assim, a Bíblia servirá para mais alguma coisa do que legitimar a nossa perspectiva?

/me disse...

David, concordo contigo. A questão - penso que concordamos - está em saber fazer uma contextualização fiel.

Concordas que tanto é perigosa uma contextualização excessiva quanto o traduzir a letra mas não o espírito? Ou defendes uma tradução à letra? No último caso, respeito, mas tenho de discordar. Obrigado por teres comentado aqui. :)